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quinta-feira, 1 de setembro de 2022

Indústria tem forte alta no PIB no trimestre, mas setor ainda amarga perdas e desemprego

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De seus 25 subsetores, 16 ainda não conseguiram registrar mesmo nível de atividade de janeiro de 2020. Empresas e trabalhadores sentiram o baque do aumento dos preços e da diminuição da renda dos brasileiros.
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Por Thaís Matos, g1

Postado em 01 de setembro de 2022 às 12h45m

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Indústria tem alta de 2,2% no PIB
Indústria tem alta de 2,2% no PIB

A economia brasileira cresceu 1,2% no segundo trimestre – mas a recuperação vem marcada pela desigualdade entre os setores.

O resultado da indústria, com crescimento de 2,2% sobre o trimestre anterior, surpreendeu positivamente.

Mas, vindo de uma série de trimestres com resultados fracos (veja no gráfico abaixo), o setor ainda patina: é o único dentro do PIB (Produto Interno Bruto) que ainda não recuperou as perdas da pandemia. De seus 25 subsetores, 16 ainda registravam, em junho, desempenho abaixo do que tinham em janeiro de 2020.

Os dados dos setores usados nesta reportagem são das pesquisas mensais de cada um deles, divulgadas pelo IBGE, e que são usadas, juntamente com outros dados coletado pelo instituto, para o cálculo do PIB.

Os números apenas consolidam o que vivem empresas e funcionários: prejuízos financeiros, cortes de pessoal, trabalhadores desempregados há meses e pouca perspectiva de melhora.

Desigualdade dentro da indústria

Mesmo dentro da indústria, há gente sofrendo de maneira muito mais intensa que outros: quatro setores registravam, em junho, perdas nos dois dígitos em relação ao período pré-pandemia.

As maiores quedas de junho em relação a janeiro de 2020 foram:

  • Fabricação de móveis: -21,2%
  • Fabricação de produtos farmoquímicos e farmacêuticos: -19,4%
  • Fabricação de outros equipamentos de transporte: -16,8%

Já na comparação entre o segundo e o primeiro trimestres deste ano, quem mais sofreu foi o setor de fabricação de alimentos. Com o aumento do custo de produção de um lado e a diminuição do poder de compra do outro, a indústria precisou reduzir a atividade.

"A queda de renda faz com que as pessoas migrem para alimentos mais baratos. Elas procuram alimentos como batata e arroz, e as opções mais industrializadas, de maior valor agregado, perdem demanda", explica o economista Juan Jensen, sócio da consultoria 4i.

  • Na realidade, as fábricas tiveram que diminuir a quantidade de produtos disponíveis para venda, principalmente aqueles que custam mais para serem feitos e são mais caros no mercado.
  • Queijo Santo Casamenteiro da Cruzília: produção de queijos finos premiados até internacionalmente atrai turistas para a cidade de Cruzília — Foto:  Crédito: Divulgação Comercial UltraCheese
  • Queijo Santo Casamenteiro da Cruzília: produção de queijos finos premiados até internacionalmente atrai turistas para a cidade de Cruzília — Foto: Crédito: Divulgação Comercial UltraCheese

Setor de laticínios sofre

Detentora das marcas Cruzília, Lac Lélo, Búfalo Dourado e Itacolomy, a Ultracheese parou de vender cortes maiores e mais caros de queijos, como o brie e o gruyère, além de ter diminuído e zerado algumas ofertas de queijos sem lactose.

Ela também passou a apostar mais nos produtos mais baratos como forma de ganhar com "eficiência", conta o diretor de operações Edson Martins, porque o custo de produzir um tipo só em grande quantidade é menor que o de fazer vários tipos de queijo em quantidades menores.

A empresa também teve que aceitar um pouco de prejuízo e precisou renegociar todos os seus contratos.

"Negociamos descontos com fornecedores de insumos e embalagens. E tivemos que pensar como fazer para repassar o mínimo possível ao consumidor. No nosso caso em específico, a gente teve um aumento da matéria-prima de 35 a 40% e a gente passou 18% para o consumidor. Para o restante, a gente buscou a eficiências dentro de casa, mas tivemos que comprometer a margem da companhia."

A dificuldade da indústria se ancora em vários fatores. Segundo Jensen, o principal deles é o redirecionamento do consumo de bens para serviços, após a reabertura, o que levou à queda do varejo e da produção de bens.

"Temos também um quadro de mercado de trabalho e de preços que também afetam a dinâmica dos mais diversos setores. De um lado, o número de pessoas empregadas aumentou, mas a renda delas não voltou ao mesmo patamar por causa da inflação. Os preços aumentaram devido à demanda aquecida e diante da conjuntura internacional de retração de oferta em função da dificuldade das cadeias produtivas e falta de insumo. Então tivemos um aumento de preços muito forte que corrói renda", explica.

Alta dos juros e inflação acima dos dois dígitos, falta de peças e matérias-primas também contribuem para o fraco desempenho da indústria, explica Fabio Fares, especialista em análise macro da Quantzed.

Outros setores

Mesmo que o comércio e os serviços já tenham superado o patamar de antes na pandemia no geral, quando se olha especificamente por subsetor, 12 das 28 subdivisões ainda não haviam se recuperado em junho.

Os setores que, em junho, mantinham as maiores distâncias do patamar da pandemia entre os serviços eram:

  • Serviços audiovisuais, de edição e agências de notícias: -9,8%
  • Serviços de alojamento e alimentação: -7,2%
  • Telecomunicações: -6,8%

E entre os setores do comércio:

  • Livros, jornais, revistas e papelaria: -33,2%
  • Equipamentos e materiais para escritório, informática e comunicação: -13,1%
  • Móveis e eletrodomésticos: - 12,9%

Apesar de o comércio ter se recuperado, a atividade vem registrando queda mês a mês desde abril. Também aqui, inflação e juros estão na raiz do problema.

"As pessoas evitam gastar dinheiro à toa. Com medo, procuram gastar com o básico porque o salário não fecha a conta. A migração de investimentos para renda fixa é muito grande porque as pessoas estão evitando gastar dinheiro agora", explica Fares, da Quantzed. 
  • Como empresários e trabalhadores sentiram o impacto
  • Raquel Teles dos Santos, ex-funcionária da Pettit Sachet — Foto: Arquivo pessoal
  • Raquel Teles dos Santos, ex-funcionária da Pettit Sachet — Foto: Arquivo pessoal

A recuperação lenta também impacta a oferta de empregos, que segue lenta.

A empresa onde Raquel Teles dos Santos trabalhava alegou que estava "no vermelho, com muita dificuldade" para dispensá-la, em março deste ano – 10 meses depois de contratá-la. Antes da demissão, ela já estava com salários e vales atrasados há dois meses.

Santos ainda não conseguiu se recolocar no mercado. "Já me inscrevi em 50 vagas nesse período", conta. Além da crise do setor, ela sente que a idade, 43 anos, a coloca em desvantagem.

A Ultracheese não demitiu, mas precisou fechar vagas quando as pessoas saíam da empresa por conta própria nos primeiros meses do ano. Agora que o preço do leite do leite está se normalizando, eles já voltaram a abrir algumas das vagas fechadas.

Carlos Vicente é presidente do Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias de Laticínios e Alimentação de São Paulo. Ele diz que precisou fazer 6 greves e paralisações este ano para garantir pelo menos a reposição da inflação nos salários, mas todos os casos foram parar na Justiça por falta de acordo.

Para os economistas ouvidos pela reportagem, a persistência dos juros altos vai ser uma pedra no sapato da indústria brasileira. Agora, se a inflação continuar a cair, o cenário fica mais favorável.

Com Selic alta desse jeito, ninguém quer saber de investir ainda mais em tempos de volatilidade com eleições. Incertezas políticas não ajudam na recuperação. Isso tende a se recuperar quando tivermos a perspectiva de que a Selic irá cair, por volta do meio do ano que vem. E isso também depende do resto do mundo, que também precisa voltar ao normal, avalia Fares.

Quando isso passar, a indústria brasileira vai precisar voltar a olhar para seus problemas, como as "discussões de desindustrialização e questões de vantagem competitiva que afetam especificamente o setor", explica Jensen.

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