IBGE revisou resultado do 1º trimestre para uma queda de 2,5%, ante leitura anterior de recuo de 1,5%. Com pandemia, economia brasileira regrediu ao patamar do final de 2009.
Por Darlan Alvarenga e Daniel Silveira, G1 — São Paulo e Rio de Janeiro
01/09/2020 09h00 Atualizado há uma hora
Postado em 01 de setembro de 2020 às 10h00m
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O Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil teve um tombo histórico de 9,7%
no 2º trimestre, na comparação com os 3 primeiros meses do ano, devido
ao impacto da crise do coronavírus, segundo divulgou nesta terça-feira
(1) o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Com o resultado, a economia brasileira entra oficialmente em recessão
técnica, caracterizada por dois trimestres consecutivos de encolhimento
do nível de atividade.
Trata-se da queda mais intensa desde que o IBGE iniciou os cálculos do PIB trimestral, em 1996. Até então, o maior tombo já registrado no país tinha ocorrido no 4º trimestre de 2008 (-3,8%).
Em relação ao 2º trimestre de 2019, a queda foi ainda maior, de 11,4%.
"Ambas as taxas foram as quedas mais intensas da série, iniciada em 1996. No acumulado dos quatro trimestres terminados em junho, houve queda de 2,2% em relação aos quatro trimestres imediatamente anteriores", informou o IBGE no comunicado oficial.
O IBGE também revisou o resultado do 1º trimestre para uma queda de 2,5%, ante leitura anterior de recuo de 1,5%. No acumulado no 1º semestre, o PIB caiu 5,9% em relação a igual período de 2019.
O PIB é a soma de todos os bens e serviços produzidos no país e serve
para medir a evolução da economia. Em valores correntes, o PIB do
segundo trimestre totalizou R$ 1,653 trilhão.
O resultado do 2º trimestre veio dentro do esperado pelo mercado e pelo governo. Levantamento do G1 mostrou que, de 12 consultorias e instituições financeiras consultadas, 10 projetavam um tombo de entre 8% e 10%.
Economia regride ao patamar de 2009
A
nova recessão é diferente das anteriores não só pela intensidade como
também por ter sido detonada por uma crise sanitária global, que
exigiu medidas de isolamento social para a contenção da pandemia de
Covid-19. Embora seja uma crise mundial, aqui ela chega com o agravante de ter afundado a economia antes mesmo do Brasil ter se recuperado das perdas da última recessão, de 2014-2016.
De acordo com a coordenadora de Contas Nacionais do IBGE, Rebeca de La Roque Palis, com esse resultado o PIB ficou no mesmo patamar do final de 2009,
auge dos impactos da crise global provocada pela onda de quebras na
economia americana. No 1º trimestre, a economia já tinha regredido ao
patamar de 2012. Ou seja, em 3 meses, o PIB brasileiro andou 3 anos para
trás.
“Com esse resultado, a gente está 15,1% abaixo do pico, que foi no primeiro trimestre de 2014”, destacou.
O caminho da recessão: como o Brasil chegou à queda histórica do PIB
Principais destaques do PIB no 2º trimestre
- Agropecuária: 0,4%
- Indústria: -12,3%
- indústria extrativa: -1,1%
- indústria de transformação: -17,5%
- construção civil: -5,7
- Serviços: -9,7%
- Comércio: -13%
- Consumo das famílias: -12,5%
- Consumo do governo: -8,8%
- Investimentos: -15,4%
- Exportação: 1,8%
- Importação: -13,2%
Entre os segmentos, a maior queda foi na indústria (-12,3%), seguida por serviços (-9,7%). A agropecuária teve alta de 0,4%.
"Somados, indústria e serviços representam 95% do PIB nacional", destacou o IBGE.
A retração dos serviços e da indústria foi a maior já registrada em toda a série histórica do PIB, iniciada em 1996.
Nos serviços, que possui maior peso no PIB (da ordem de 75%), a maior queda foi em outras atividades de serviços (-19,8%), que engloba serviços prestados às famílias.
Também houve queda expressiva em transporte, armazenagem e correio
(-19,3%) e comércio (-13,0%), que estão relacionados à indústria de
transformação. Os únicos resultados positivos no setor foram verificados
em atividades financeiras, de seguros e serviços relacionados (0,8%) e
as atividades imobiliárias (0,5%).
Consumo das famílias tomba 12,5% mesmo com auxílio emergencial
O tombo de 12,5% no consumo das famílias – principal motor do PIB há anos – também foi recorde.
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“O consumo das famílias não caiu mais porque tivemos programas de apoio
financeiro do governo. Isso injetou liquidez na economia. Também houve
um crescimento do crédito voltado às pessoas físicas, que compensou um
pouco os efeitos negativos”, destacou Rebeca Palis.
Já o consumo do governo recuou 8,8% no segundo trimestre, muito por conta das quedas em saúde e educação públicas.
Os investimentos
desabaram 15,4% ante os 3 primeiros meses do ano. Com o resultado, a
taxa de investimento em percentual do PIB encolheu para 15%, abaixo da observada no mesmo período de 2019 (15,3%). Em 2013, chegou a superar 21%.
Em meio ao aumento do desemprego e incertezas sobre o futuro, a taxa de
poupança, por sua vez, subiu para 15,5%, contra 13,7% no mesmo período
de 2019.
PIB sob a ótica da demana — Foto: Juliane Souza/G1
PIB sob a ótica da demana — Foto: Juliane Souza/G1
Setor externo
A balança de bens e serviços registrou uma alta de 1,8% nas exportações, enquanto as importações recuaram 13,2%.
“Essa alta nas exportações tem muito a ver com as commodities, produtos
alimentícios e petróleo. Já as importações caíram em vários setores, de
veículos, toda a parte de serviço, viagens, já que tudo parou devido à
pandemia”, destacou a pesquisadora.
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Recessão recorde e perspectivas
A queda
recorde em apenas um trimestre supera a perda acumulada em qualquer uma
das últimas 9 recessões que o Brasil passou nos últimos 40 anos.
Na recente crise de 2014-2016, o tombo foi de 8% no acumulado em 11
trimestres, segundo o Comitê de Datação de Ciclos Econômicos (Codace),
que considera que o Brasil entrou em recessão já no 1º trimestre. Já na recessão de 1981-1983, a perda foi de 8,5% em 9 trimestres.
Segundo a economista Luana Miranda, do Ibre/FGV, a perda acumulada nos 2
primeiros trimestres de 2020 é de 11,9%, o que já faz desta a recessão
mais profunda desde a década de 80.
Após despencar 3,5% em 2015 e 3,3% em 2016, o PIB brasileiro registrou
taxa de crescimento de 1,3% em 2017 e em 2018, desacelerando para um
ritmo de 1,1% em 2019.
Se no começo do ano, a economia já mostrava perda de fôlego, agora, com
o choque provocado pela pandemia, a retomada deverá demorar ainda mais
para ser alcançada. A avaliação dos economistas é que a economia
brasileira só deverá recuperar o patamar pré-pandemia em 2022.
Mesmo com a reação já observada em setores como comércio e indústria, ainda há muitas dúvidas sobre o comportamento da economia nesta reta final do ano em
meio ao encerramento ou enxugamento de medidas de alívio dos reflexos
da pandemia no país, desemprego em alta, preocupações sobre o rumo das
contas públicas, além de incertezas sobre a evolução da pandemia.
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De qualquer forma, a avaliação no momento é que o PIB deverá voltar para o azul no 3º trimestre, tirando assim o país da recessão técnica.
A estimativa atual do mercado é de um tombo de 5,28% do PIB em 2020,
segundo a pesquisa Focus do Banco Central. Mesmo com a melhora das
previsões nas últimas semanas e redução do pessimismo, ainda deverá ser de longe o pior desempenho anual já registrado
no país. Pela série histórica do IBGE, iniciada em 1948, as maiores
quedas foram registradas nos anos de 1981 e 1990, quando houve um tombo
de 4,3% no PIB anual.
O IBGE esclareceu que, por conta da pandemia, foi aplicado um
tratamento especial aos dados relativos à administração pública e
educação. Foi considerando que instituições públicas voltadas ao
atendimento ao público, como parques e museus, não funcionaram, assim
como não houve aulas, tanto na rede pública quanto privada, para os
alunos da educação infantil.
“A gente não mudou a metodologia. Foram tratamentos específicos para
esse período de pandemia seguindo recomendações internacionais. Todas as
atividades que só tiveram mudança do trabalho presencial para o remoto,
não houve alteração”, explicou a coordenadora de Contas Nacionais do
IBGE.
Segundo ela, sem o tratamento especial, “teríamos uma queda menor da
administração pública” – a educação pública entra na conta do consumo do
governo, enquanto a privada entra no cálculo do consumo das famílias.